Dentre
as minhas manias, uma esquisita, porém não sistemática, nasceu na adolescência.
Não tenho notícias de relatos parecidos. Não reclamarei a originalidade. Penso
que existam companheiros simílimos.
Lembrei-me,
nesta semana, da primeira manifestação dessa tal mania. Em meados de mil
novecentos e setenta e um, do nada, num momento de quietude e divagação
juvenil, veio a idéia de me imaginar com quarenta anos a mais dos dezesseis que
já tinha. De repente, lá estava eu, virtualmente, com cinquenta e seis anos.
Levei um susto danado, pensei: “mas que coisa estranha... estou mais velho que
meu pai. Tô velho pra caramba!”. Confesso, um friozinho mórbido varreu a minha
espinha.
Era
uma época em que muita gente pensava – eu também – que o mundo não passaria do
ano 2000. Logo, assim que eu assumi o controle da situação, a primeira coisa
que me veio à tona foi: “sem problemas, acabando o mundo, não chegarei a esses
cinquenta e seis anos, não me verei tão velho”. Felizes os nascidos depois dos
anos cinquenta. Esse foi o meu pensamento favorito, por alguns anos. Não nos
daria a oportunidade de viver a terceira idade. Que bobagem, meu Deus!
Volta
e meia, esse “cinquenta e seis” visitava a minha imaginação. Não sei a razão,
mas era um número que me fascinava. Achava ele bonito e harmonioso. Talvez por
ser uma
uma sequência numérica formada por dois números localizados no meio da escala
de zero a dez ou por representar o ano do meu primeiro aniversário ou por ser
garantidor de aprovações fora da zona de rebaixamento. Sei lá! Nunca o usei
como um número cabalístico ou de sorte.
Pelo
menos uma vez por ano, desde então, eu somava anos à idade em curso. Às vezes
usava trinta, noutras, quarenta, e até cinquenta entrava na roda. Bastou a
ultrapassem da juventude para que essa mania me levasse a refletir, mais
profundamente, sobre os anos futuros e eu dentro deles. Eu usava os parâmetros
reais do momento vivente e os projetava, confrontava com as previsões otimistas
e pessimistas, daí surgiam, naturalmente, as correções de rota. Não posso
concluir que esses procedimentos tenham influenciados, decisivamente, a minha
vida ou os meus costumes. Mas, me lembro muito bem, que ao final de cada
processo instalava-se uma sensação confortável e motivadora.
Foi
num desses momentos, por exemplo, - e não faz tanto tempo - que encarei a
velhice de frente, sem qualquer manobra postergatória. Comecei a me preparar.
Passei a desvendar atividades, desde que prazerosas, que pudessem, com naturalidade,
preencher o meu dia a dia, substituindo, gradativamente, a correria, pela
contemplação; o estresse, pela normalidade; a ansiedade, pela acomodação; a
briga, pela pacificidade; a fúria, pela serenidade. Vi melhoras na
criatividade.
Noutro
momento importante veio o planejamento de cuidar do meu corpo. Antes, relegado
ao segundo plano, eu permitia a deterioração dos sistemas, sem as
contrapartidas fortalecedoras. Busquei atividades físicas para melhorar o meu
condicionamento, reforçando, principalmente, a estrutura muscular. Comecei a
frequentar as aulas de hidroginástica da Santa Fé e, mais tarde, as de natação.
Nessa toada, estou entrando no quarto ano, ininterrupto.
Eis
que os 56, de fato, chegaram. A partir de hoje, os meus anos de vida serão
sempre superiores à dezena do ano em que nasci. Não sei qual é a importância
disso, mas não deixa de ser uma novidade.
Graças
a Deus, o mundo não acabou em 2000. Pude acompanhar meus filhos vencendo a
infância e a adolescência. E Hoje, posso vê-los vivendo a juventude em
preparação para as conquistas que virão. Espero poder acompanhar parte da vida
dos meus netos. Nesse tempo vivido, entendi que a vida é uma cultura em que a
gente planta e colhe. Planta e colhe. Planta e colhe... Aprendi que a
vida não se basta pela sorte, nem pelo azar, mas pela paz de espírito que ela
contempla e que granjeia a alegria de viver. Razão fundamental para quem não
pisa nesse planeta como reles passageiro. Que aceita a morte como parte da vida
e, não necessariamente, como uma passagem para algo que possa ser melhor ou
pior. Mas como um prêmio, um certificado de participação, preferencialmente,
com honra ao mérito e agradecimento pelos bons serviços prestados. Antes e
depois da aposentadoria.
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