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Itapira, 19 de Abril de 2024
Artigo
06/11/2010 | Entrevista ao jornal A CIDADE - 6 de novembro de 2010, sobre as eleições - 2º turno.

1.      Ao completar 121 anos de República e a soma de 35 homens na Presidência indicados, impostos ou eleitos direta ou indiretamente, uma mulher chega a ponto mais alto da hierarquia política nacional. Você acha que a mulher brasileira está preparada para esse cargo?

Não é de hoje que alerto sobre a brevidade da hegemonia masculina. Escrevi vários artigos colocando as mulheres no topo do mundo. Não fazia isso por adulação barata. Fazia por reconhecer os sinais emanados. A história nos mostra que os domínios masculinos foram lastreados, antes na força física, depois no poderio financeiro, enquanto isso às mulheres reservava-se às tarefas de casa, à educação das crianças e aos trabalhos manuais. Até meados do século passado, elas não podiam votar, nem serem votadas. Em pouco tempo, botando uma colher aqui, outra ali, ganharam as ruas, estudando com seriedade e disciplina, aprendendo o jogo da vida, proclamaram a independência sob o olhar indolente, pasmado e desarmado dos homens. No mercado de trabalho buscaram e conquistaram os postos mais elevados. Na política foram eleitas prefeitas e governadoras.  A Presidência da República era uma consequência natural. Nesse início de século sacramentamos dois grandes momentos como testemunhas oculares participantes: as eleições de um operário de origem e de uma mulher com raiz subversiva. Dois preconceitos jogados nos fichários da história. Dilma não assumirá a presidência por acaso. Podemos esperar por um excelente governo, menos pelo PT e Lula, mais por sua condição de mulher.

 

2.      O Brasil tem pela frente problemas sérios a serem enfrentados. No campo externo, a guerra cambial. Internamente, reformas fundamentais para assegurar o crescimento do Brasil. Qual é a sua expectativa para o governo Dilma?

Lula, ao assumir o governo, levou projetos construídos e aperfeiçoados desde a fundação do PT. Nem tudo era delineado, mas ele sabia onde queria chegar. Mas tinha que colocar a casa em ordem, mexer com vespeiros, arrumar confusões num sistema que estava devidamente aparelhado. Precisava mais do que competência. Conseguiu. Com Dilma, os entraves serão menores. Ela levará a visão de ajustes pontuais em função do conhecimento da situação e o espírito de continuar o que esta dando certo, mas saberá imprimir o seu jeito de governar. Lula sai com a convicção de que não realizou tudo o que queria, mas leva a tranquilidade de quem vê o processo em boas mãos.  Dilma tem um plano de ação consistente, suas entrevistas, depois de eleita, sinalizam confiança e resultados. Sabe o que fará para atenuar a guerra cambial alimentada por EUA e CHINA. Não hesitará em colocará as reformas política, tributária, previdenciária e trabalhista na pauta. Além disso, ela manterá princípio da erradicação da miséria como ponto inegociável e terá ação diferenciada na saúde e na educação.

 

3.      Os dois candidatos se queixaram do nível da campanha. A imprensa e a opinião pública criticaram as baixarias. Qual é a sua opinião a respeito desse assunto?

Não podemos classificar de baixaria aquilo que é visto de forma diferenciada. Quando o meu candidato é agredido, é baixaria. Quando ele agride, é defesa necessária.  Eu prefiro nomear esse processo como confronto entre candidatos. Esse confronto sempre esteve e sempre estará presente nos embates eleitorais, aqui e em qualquer lugar democrático do mundo, desenvolvido ou não. Quando o confronto parte dos próprios candidatos ou das campanhas oficiais, o eleitor indeciso absorve o que lhe interessa e descarta o exagero. Os excessos de denuncias vesperais e as agressões mais violentas acabam suprimindo votos. Candidato só bate, quando não tem outro jeito para tentar ganhar as eleições. Mas o risco é alto. É ato de desespero. Precisa ser meticulosamente estudado e aplicado. Entre os marqueteiros políticos existe um postulado: ‘candidato que bate, perde’. Dito isso, não dou a importância que muita gente dá esses embates. Acredito na avaliação do eleitor. O importante é que o eleito não leve para o gabinete os rancores da campanha. Mostra falta de preparo político e dificuldade para lidar com a adversidade. Quem não está preparado para isso, não deve se habilitar para nenhum cargo eletivo. Não é a sua praia.

4.      A internet entrou na campanha para valer e desempenhou um papel importante nessas eleições, qual é a sua avaliação sobre esse recurso tecnológico?

Os candidatos exploraram essa tecnologia como complemento das informações sobre as suas propostas governamentais através dos blogs e sites, e como contato direto com o eleitor, através das redes sociais. Os desavisados acreditam que na Internet vale tudo em função da amplitude democrática que ela oferece.  Muitos apoiadores, dos dois lados, na ânsia de ajudar seus candidatos tentaram difundir informações caluniosas de todos os matizes. Os internautas descolados, conhecedores do sistema, repudiam, em qualquer tempo, os exageros e as noticias descabidas. Usam-nas, no máximo, como material de humor. Vi, no entanto, pessoas provavelmente desafeitas do sistema internético ou por má fé, letradas, supostamente bem informadas, propalar, no mundo real, noticias, não produzidas pela imprensa, trazidas por emails ou blogs de origem duvidosa e transformadas em verdades incontestáveis. É condenável, mas faz parte dos riscos da plena democracia, onde se fala o que quer e se ouve o que não quer. Evoluiremos na medida em que esses procedimentos não surtam os efeitos desejados, eles tenderão ao uso correto da informação e entretenimento. A internet será o principal meio de comunicação política dentro de pouco tempo.

5.      A religião deu o ar da graça nessa campanha. Os bispos redigiram, assinaram e distribuíram manifestos. O Papa mandou um recado eleitoral para os brasileiros. Pastores evangélicos fizeram campanha política nos templos e na TV. Você concorda com esta interferência religiosa já que somos um país constitucionalmente laico?

Dois pontos devem ser friamente destacados. Primeiramente, nada impede que as instituições religiosas se manifestem e orientem os seus seguidores quanto às suas doutrinas. Pecam ao tentarem impor suas convicções para o conjunto da população. Quando exageram, como parece ter sido o caso, acabam mais perdendo do que ganhando.  Somos um país laico. Não queremos ser influenciados ou controlados por qualquer ordem religiosa. Como país democrático vale a decisão da maioria. A outra questão, esta sim muito séria, foi o uso político dessas interferências na campanha, na tentativa de reversão do quadro eleitoral, fazendo com que os dois candidatos usassem expressões, gestos e símbolos alheios à sua vida habitual na tentativa de angariar simpatias junto às comunidades religiosas. Usaram a boa fé do povo. Um fato condenável e triste.

6.      Os debates televisivos esperados pela população e aguardados pelos candidatos que estão em situação desfavorável nas pesquisas contribuíram com a eleição desse ano?

O confronto direto é o melhor recurso de campanha. Contribui para as definições que a propaganda eleitoral e o noticiário não permitem por conta das ações marqueteiras. O eleitor indeciso carece de sinais com maior espontaneidade para que a sua sensibilidade lhe ofereça o caminho a ser seguido. Os debates, no entanto, por exigência dos próprios candidatos, a cada ano são mais restritivos e para a maioria dos telespectadores, nada emocionantes, nada novidadeiros. Acho que os debates pouco ou nada contribuíram. Quem começou a assistir como Serra, terminou como Serra, não virou Dilma.

7.      As pesquisas foram criticadas. O PSDB chegou a proibi-las no Paraná e ameaça a mudar a legislação para limitar a divulgação. Você acha que elas erraram? Elas influenciam os eleitores? Você concorda com o controle da divulgação das pesquisas?    

Em ano de eleição é sempre a mesma coisa. Quem está na frente diz que a pesquisa está certa. Quem está atrás, aponta erros esporádicos para colocar dúvidas sobre os levantamentos. O mesmo que critica num dia, noutro elogia. Acho que são os candidatos que confunde o eleitorado, não as pesquisas. Os grandes institutos realizam seu trabalho como qualquer negócio. Cobram os olhos da cara pelos serviços.  Para eles, o importante é acertar com proximidade a antecipação dos resultados. Acertando, ganham credibilidade e novos negócios. Errando, afugentam clientes e podem sumir do mapa. A cada eleição descobrimos que a influência é ínfima. É decisiva, talvez, para os financiadores dos candidatos.  Caso a pesquisa influenciasse o voto, como se alardeia, não teríamos modificações depois da primeira divulgação. Não é o que acontece. Pesquisas e estatística são uma ciência. Usam metodologia científica para apontar tendências, não resultados finais exatos. Trabalham com margem de erro, estatisticamente justificável. Podem errar. Podem não conseguir captar a tendência da opinião pública. Nem por isso deve receber a classificação de atuar com má fé. Podem existir erros metodológicos que são posteriormente depurados. Todos os candidatos usam as pesquisas para cada passo dado no dia a dia de campanha. Às vezes, exageram na subserviência. Não concordo com o controle da divulgação das pesquisas. Elas são orientadoras e, principalmente, reforçadoras da proclamação dos resultados. 

8.      Os partidos da base aliada elegeram a maioria dos deputados e senadores e 17 governadores. A base oposicionista ficará menor no Congresso Nacional, elegeu 10 governadores e governará a maioria dos eleitores (52%) e 60% do PIB, entre eles São Paulo que produz um terço da riqueza nacional (34%). Como você analisa a futura relação da presidente Dilma com a oposição?

Antes de qualquer coisa, vale a pena o registro de que os resultados contrariaram aqueles que acreditavam e difundiam o medo do Brasil ser governado por um partido único. Prova cabal de que os nossos políticos não acreditam no discernimento do povo que lhe oferece o voto. Outro ponto é quando se diz, sem apurar os resultados, que Dilma seria ou foi eleita graças ao Norte e Nordeste. Os números mostram que as regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste garantiram a eleição de Dilma e a franca maioria dos deputados e senadores. O Norte e o Nordeste fizeram a ampla diferença.  Dilma terá as facilidades no Congresso que Lula não teve, mas nem por isso estará livre para fazer o que bem entender.  Terá que dialogar muito. Tem a maioria dos governadores, mas suará a camisa para trazer os governantes contrários para os projetos comuns na área da saúde, segurança e educação. Dilma, no discurso de vitória, esqueceu os ataques, estendeu a mão e chamou a oposição para o diálogo. Mostrou  respeito aos opositores. Sabe que a responsabilidade pelos erros ou pelos acertos é dela e não dos opositores. 

9.      Qual é a sua visão sobre o futuro da oposição? Quem assumirá nacionalmente o comando político oposicionista? Serra voltará candidato em 2014?

A oposição perdeu o rumo nesses últimos anos. Sem bandeira atacou as ações governamentais, mas esqueceu de se apresentar como alternativa concreta de poder. Denunciou os escândalos, mas não ofereceu propostas para dizimá-los. Não projetou na campanha a redução dos cargos em comissão e nem as punições às empresas corruptoras. Nos estados governados por ela impediram, o quanto pode, a abertura de CPIs e das investigações. Para o eleitor, discurso não ganha voto. Outro fator que salta aos olhos é a falta de uma liderança que possa aglutinar os oposicionistas em torno de uma ação conjunta e eficiente. Nas três eleições o PSDB entrou e saiu dividido. Parece que a briga busca atender apenas a ânsia pessoal de poder deste ou daquele medalhão, não se esboça um projeto de poder para governar o Brasil. Agora, mal terminada a apuração, os resquícios da escolha de Serra como candidato presidencial vieram à tona. Serra, Alckmin e Aécio estão se engalfinhando para ver quem será o herdeiro do espólio. Vejo Aécio com mais fichas. Caso ele não seja conduzido ao primeiro lugar do pódio, o PSDB deverá caminhar para a dissidência, culminando na criação de um novo partido de centro-direita, reunindo parte do PSDB, DEM e setores descontentes do PMDB. Apesar de Serra ter anunciado um até logo, não acredito que ele possa retornar para a disputa presidencial. A bola ficará com Aécio e Alckmin de botuca.

10.   Essa campanha foi marcada por desigualdades exageradas. De um lado um governo com 84% de aprovação, desemprego em baixa, alto nível de consumo e salário médio em evolução, classe pobre que virou classe média, classe média que comprou carro novo e passou a viajar de avião etc. Do outro uma oposição perdida, sem bandeiras e, tecnicamente, desunida. O PSDB reclama que Lula pegou o país pronto para crescer, vislumbrou e apoderou-se dos resultados. Reclama, também, que Lula desconsiderou a herança recebida e vendeu todos os benefícios como se nada tivesse acontecido antes dele. O que você tem a dizer sobre esse processo?

A reclamação é vendida como justa, mas não é. Erram quando falam que o desempenho de Lula foi derivado, unicamente, das ações de FHC. O fato de terem acertado na estabilidade (e ninguém nunca negou isso) não significa que todas as medidas seguintes foram totalmente acertadas. Pois, não foram. O mais interessante dessa história é que eles próprios reconheceram os erros no final do primeiro mandato de FHC em discursos de alerta no Congresso Nacional. Reconhecimento que resultou na ausência de FHC e a não defesa do seu legado nas três últimas campanhas presidenciais.  Para confirmar essa tese, nesta semana, FHC ameaçou no jornal Folha de São Paulo que não está mais disposto a dar endosso a um PSDB que não defenda a sua história. Eis o cúmulo da desfaçatez, eles próprios não acreditavam no governo que desenvolveram, mas queriam que o PT fizesse as honras da casa, elogiando o que eles não tiveram coragem de elogiar. Agora, espero que a oposição se restabeleça, junte os cacos rapidamente e busque formatos mais condizentes para o papel que lhes cabe. Qualquer governo sem oposição fede. 

11.   Em Itapira, a vitória de Serra foi acachapante. No Estado Serra ganhou com 54%, aqui faturou 72%. Itapira não gosta do Lula, da Dilma ou do PT?

Lula sempre perdeu as eleições por aqui, salvo em 2002, quando ganhou no primeiro turno (53%) e no segundo (61%). Nas eleições para governo e senado não ficávamos em primeiro, mas recebíamos uma votação significativa. Para deputados, prefeitos e vereadores nunca conseguimos acompanhar as votações majoritárias nacional e estadual. A exceção ficou por conta do vice-prefeito, em 2004 e 2008, que contabilizou as votações recebidas pelo candidato a prefeito. O triste dessa história é que o PT em Itapira não se alavancou por conta das duas eleições municipais e das três nacionais, ambas vitoriosas, assim como não conseguiu absorver o momento político e econômico favoráveis. Os dirigentes municipais do PT precisam olhar mais para os próprios umbigos. O poder municipal local não nos fez bem. Corremos o risco de sair piores do que entramos. Nem sempre a boca garante a entrada do alimento.  
 

12.   O deputado Barros Munhoz influenciou na votação que Serra recebeu de Itapira?

Com certeza. Mesmo que se queira tentar desqualificar Munhoz no desempenho de Serra na cidade, os 28 mil dados ao Deputado e os 28 mil recebidos por Serra complicam qualquer artimanha fantasiosa. Outro detalhe que não pode ser esquecido é que na eleição de Lula com o mesmo Serra, em 2002, com Barros Munhoz neutro, Lula ganhou. Um destrambelhado qualquer poderá até invocar que Lula, naquela oportunidade, foi favorecido pela lástima do governo FHC. O que não deixa de ser verdade. Mas Dilma, usando a mesma relação, tinha, ao contrário de Serra, o governo anterior melhor avaliado de todos os tempos. Logo, a influência de Barros Munhoz, nessas eleições é inquestionável. Quae sunt Caesaris, Caesari (A César o que é de César!).

 

13.   Dada a animosidade entre o governo local e o deputado Barros Munhoz Itapira está fadada a ter dificuldades com as verbas estaduais. O fraco desempenho de Dilma na cidade e os poucos votos transferidos para a senadora Marta e aos deputados federais e estaduais apoiados e eleitos pelo grupo situacionista poderão refletir negativamente e isolar Itapira do rol das verbas especiais, aquelas que são dependentes das intervenções políticas?

Na esfera estadual, considerando que o PV está alinhado com o governo estadual, na qual Barros Munhoz mostrou ter mais influência do que os lideres pevistas locais e que o PSB integrará a bancada oposicionista ao lado do PT, Itapira só terá acesso às destinações quando comandadas pelo ex-prefeito. Logo, o único recurso dos situacionistas passa por uma composição branca com o seu maior desafeto. Na esfera federal, é natural aos deputados eleitos carrear seus encaminhamentos para as regiões que lhe renderam apoios mais expressivos. Em face de ajustes nas contas, naturais em início de mandato, não haverá dinheiro sobrando. Por conta disso, poderemos ficar sem pai, nem mãe. Penso, para que não fique o dito e o redito, pelo não dito,  que Toninho Bellini deveria encontrar um formato não estuprador das suas entranhas psicológicas  para garantir as verbas estaduais e atender as necessidades de Itapira. O povo não pode pagar a conta das desavenças. O que é pior, essa situação dá ao povo a idéia de que a melhor opção é a verticalização dos votos: por isso Barros Munhoz, Montoro, Aloysio Nunes, Alkcmin e Serra. Eu, de longa data, não gosto e não aprovo o sistema assistencialista prestado pelos deputados. No entanto, brigar com regra reinante é pura bobagem. Perder a oportunidade, idiotice.  Racionalmente, não acredito que Bellini e Totonho superem suas divergências e coloquem o povo de Itapira no lugar merecido. Mas continuo a ter esperança, dizem que ela demora a morrer. Espero os dois não a assassinem antes do tempo.

Fonte: Nino Marcatti

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