Carregando aguarde...
Itapira, 28 de Mar�o de 2024
Artigo
12/10/2010 | Entrevista ao jornal A CIDADE - 9 de outubro de 2010, sobre as eleições.

1 – Há anos como membro do Partido dos Trabalhadores (PT), como você analisa a atual disputa eleitoral, principalmente agora que o resultado será definido no segundo turno?

O processo democrático e o conceito de maioria só são vistos com bons olhos por alguns brasileiros quando os interesses lhe convergem. Caso contrário passa pela desqualificação dos resultados e atribui-se atributos de despreparação, voto comprado, povo iludido etc. O Brasil ostenta uma base conservadora significativa que se aninha na centro-direita, mesmo sem ter qualquer noção sobre o que isso significa. Esse grupo ficou perdido nessa eleição, não se identificou com o principal candidato oposicionista que insistiu na estratégia da continuidade com avanços. Marina Silva, ex-petista, se apresentou como terceira via e fez uma magnífica campanha.  Ela tirou os votos de Dilma que Serra não conseguiu. Portanto, o resultado é uma soma de erros da campanha de Dilma e Serra e acertos de Marina, apesar da terceira colocação.

 

2- As pesquisas falharam?

Pesquisa não é eleição. Ela faz um retrato do momento. É cientifica. Baseia-se nos fundamentos estatísticos matemáticos associados aos conceitos sociológicos e antropológicos na construção das amostras qualitativas. Os movimentos bruscos oferecem e sempre oferecerão dificuldades nas conclusões dos levantamentos de opinião. Alguns institutos detectaram esse movimento, mas não conseguiram ser conclusivos. As pesquisas não falharam, talvez tenham sido enganadas. Prova cabal de que a pesquisa não influencia o eleitor, do jeito que muita gente pensa.    

 

3 - Em sua opinião, o que faltou – ou sobrou – para que a candidata Dilma vencesse já no primeiro turno?

Faltou humildade e militância. Sobrou arrogância. Os altos índices de aprovação do Presidente Lula e a satisfação generalizada do povo brasileiro levaram muitos diretórios petistas à assistência passiva. Deixaram que Lula embalasse a cria. Eu não sei o que veio primeiro: a indolência petista ou vigor eleitoral de Lula. Veja o caso de Itapira. Que campanha Dilma recebeu do PT e aliados daqui? Eu senti “falta de compromisso” e talvez o medo de colocar a cara para bater. Em política, isso é imperdoável. Quantos petistas itapirenses usaram a imprensa local ou qualquer outro meio para defender Dilma e o PT dos ataques sórdidos sofridos nesta campanha? O silêncio é mais do que comprometedor.   

 

4 – Em sua opinião, as alianças do PT com partidos historicamente adversários, não contribui para a diluição dos ideais outrora defendidos pela grande maioria dos militantes, e talvez com isso tenha desestruturado sua base de aliança?

Vejo nessa cobrança de abandono dos ideais de outrora e de incoerência do PT uma dose exagerada de hipocrisia. Não acredito que as pessoas que tanto criticam esse eventual desalinho apoiariam o PT se ele desenvolvesse, nesses oito anos, os ideais e práticas originários.  Aliás, era justamente o rigor programático e a coerência partidária que assustava a maioria das pessoas. Logo, essa cobrança não é sincera, nem honesta. É eleitoreira ou, no mínimo, ignorante.

O fato é que o PT lançou-se como alternativa de poder. Poderia ter preservado sua virgindade e ficar eternamente na oposição. Optou por ser governo e nele tentar quebrar os paradigmas que mantiveram este país no atraso desde o descobrimento. Sabia que essa opção passava por alianças, nem todas de fino trato. Encarou o boi a unha. Paga caro pelo caminho que escolheu, mas colhe resultados interessantes. Eu acho que o preço pago pelo PT por conta das alianças é menor que o custo assumido pelo Brasil nos seus quinhentos anos de história.

 

5- Você acha que as denuncias de quebra de sigilo e do tráfico de influências contribuiu para Dilma não vencer no primeiro turno?

Não. Infelizmente a maioria do povo brasileiro, mesmo condenando veementemente as práticas delituosas na política, não as considera, de forma significativa, como fatores de exclusão de um candidato. Estão mais seletivos, mas exemplos não faltam para comprovar tal afirmação. A maioria não dissocia o político da corrupção, do levantamento de dados para prejudicar o oponente, do tráfico de influência etc.. Tem como ponto pacífico o fato de todos querem levar vantagens de um jeito ou outro, antes ou depois. Vota naquele que melhor representar melhoria para o seu futuro.

Um ponto que pesou na reta final foi a questão do aborto jogado sobre a população pela internet e pelas igrejas sem que Dilma tivesse tempo e meios para se defender. Dilma e Serra nada diferem nessa questão.

 

6- Você coloca o PT ao lado dos demais partidos que perniciosamente usam e abusam do poder?

O poder é inebriante e irresistível. Superar os seus afagos, a corrupção e a possibilidade de enriquecimento fácil não é tarefa simples. Muitos dos que hoje criticam, amanhã, lá, fariam exatamente a mesma coisa ou até pior. A história se repete.  

Sei que muitas pessoas não concordarão comigo, mas o PT continua diferente da maioria. Não inchou seus quadros parlamentares como os demais partidos governistas anteriores. Não interfere descaradamente no Ministério Público e na Polícia Federal. Tem seus aloprados, mas oferece excelentes quadros e a população consegue identificá-los.  O PT é o grande partido de centro-esquerda do Brasil. Precisa, evidentemente, do contraponto. A democracia exige a participação contrária.    

O PT de Itapira conseguiu perder a identidade ao se tornar governo. Apesar dos excelentes quadros, errou ao permanecer governista por tanto tempo, diante das atrocidades políticas e administrativas cometidas. Não sei se há chance de recuperação a curto e médio prazo. É uma pena. O PT é fundamental para qualquer cidade brasileira.

 

7– Ao que tudo indica, o modelo de bipolarização partidária da disputa eleitoral no Brasil parece estar se esgotando. Qual sua opinião sobre o fenômeno Marina Silva?

O sistema de dois turnos tem por princípio a idéia da não bipolarização eleitoral na primeira fase. Cada um deve votar de acordo com a sua consciência. A bipolarização nasceu da excrescência do voto útil nos primórdios da redemocratização, plantada, basicamente, pelo grupo que integra hoje o PSDB.

O Brasil tem a rotina da bipolarização pessoal, não partidária. Vota-se mais nas pessoas do que nos partidos. É um grande erro.

Nessa eleição, três candidatos atingiram índices consistentes e levaram a decisão para o segundo turno. Um fato auspicioso. Mostra maturidade eleitoral.

Quanto ao fenômeno Marina, a chamada onda verde, é preciso ter cuidado na analise. Bom seria que os seus vinte por cento concedidos a ela compartilhassem a sua consciência ambientalista. Mas acho que não foi por aí. Apesar de Marina não ter provocado a confusão, parte significativa dos seus votos veio de um grupo que tirou o corpo fora, para não ficar nem ao lado de Lula, Dilma e PT, nem de Serra, FHC, PSDB e DEM. Outra parte migrou para ela, dentro da mais pura onda fascista, conservadora e religiosa. Democracia é assim mesmo. O eleitorado sempre encontra uma forma de se manifestar e transmitir aos eleitos os seus reclamos. Aqueles que entenderem o recado continuarão na fita.

Marina, de qualquer maneira, cumpriu com dignidade o seu papel. Mostrou um formato diferente de se fazer política e influenciará o discurso do segundo turno. Colocou o tema do meio ambiente nas rodas de discussão, alavancou os processos em defesa do planeta e ascendeu nos jovens o interesse pela discussão política.

 

8- Qual é o seu palpite sobre o posicionamento de Marina. Será Dilma ou Serra?

Estrategicamente, o PV deve apoiar aquele que apresentar maiores chances de sair vencedor. Levaria a aura de ter influenciado o resultado. Mas o PV é um partido dividido. Em algumas regiões namora o PT, noutras o PSDB. Definir para um lado rachará o partido e perderá a injeção extra de animo recebida na eleição. Acredito que o PV liberará suas principais lideranças para que cada um penda para o lado que achar mais conveniente. Não sei se essa posição será boa para eles, mas tende a ser a “menos pior”. Marina, pessoalmente, deverá votar em Dilma pela história que ela carrega. Independentemente, os votos que ela recebeu serão distribuídos proporcionalmente entre Dilma e Serra, no final das contas.

 

 

9 – Como você avalia o desempenho do deputado Barros Munhoz, eleito de forma expressiva com mais de 180 mil votos?

Não me surpreendeu. Acompanho-o politicamente, sempre do outro lado, desde que debutou em 1976. É incontestável a sua competência na campanha eleitoral. Associa, com facilidade, o seu lado guerreiro e inteligência aplicados no cargo à sua candidatura.  Tem disposição para dar e vender. É incansável. Ninguém poderá lhe negar esses predicados. Ele não passaria pela liderança de governo e pela presidência da ALESP sem pavimentar amizades políticas e criar pólos de ação eleitoral. Colheu o que plantou. 

 

10- Como você recebeu a votação que Barros Munhoz recebeu em Itapira?

Numericamente, surpreendeu-me. Eu acreditava que ele ficaria na faixa dos 22 mil a 25 mil, que seria a sua faixa corrigida de 2006 com viés de queda em função da inclusão jovem. Mas ele deu um salto de dez pontos percentuais. Um feito notável e inesperado. Acho que nem ele, nem seus seguidores esperavam tanto. 

Aprofundando um pouco mais, tem um aspecto impactante que deve deixar seus adversários preocupados ou indolentes.  Em 2006, o segundo candidato mais votado, apoiado pelos oposicionistas da cidade, abocanhou quase cinco mil votos. Nesta eleição, os candidatos das lideranças locais adversárias atingiram patamares lastimáveis. Prova inequívoca do baixo grau de influência política dos seus opositores. Pode-se afirmar que ele reina absoluto. Diz-se pela cidade, que muitos eleitores votam em Barros Munhoz para deputado para mantê-lo longe de Itapira. Pura bobagem. Ninguém faz isso com o voto. A base é a afinidade. É o suporte.  

Ainda não sei se foi a competência dele ou a insipidez do grupo situacionista, o fato é que Itapira está aglutinada. União que há muito não se via. Posição que pode não dar carta branca a Totonho Munhoz e seu grupo, mas confirma, impiedosamente, a reprovação da conduta administrativa e política do governo Bellini.   

 

11- Em seu primeiro discurso como candidato reeleito, Munhoz disse que pretende se aproximar do governo Bellini para o bem de Itapira. Você acredita nesta suposta aproximação?

Não acredito. Não me parece que Toninho Bellini e Manoel Marques depois de seis anos de governo turrão e “desarticulador” mudem procedimentos. Critico desde os primeiros cem dias de governo os equívocos e a ausência de ações políticas desse grupo. Sabe como é: bicho teimoso morre afogado, mas não solta a prenda. Barros Munhoz lança a oferta porque sabe o que faz. Ele se mostra cordeiro, conciliador e se afina com o eleitorado majoritário que exige atitude proativa e cooperativa. Sabe que do outro lado ninguém terá cacife e disposição para peitar e acompanhar com competência longos processos de negociação. Sabe que se darão de surdos.  Por isso deita e rola. Acredito nas suas boas intenções, pois está com a faca e o queijo na mão. Não tem mais idade para recuperar e praticar os erros e exageros do passado. Está mais preocupado com a sua biografia.

Na ultima conversa que tive com Toninho Bellini, disse-lhe textualmente: “se eu fosse você encaminhava um monte pedidos devidos justificados para o Deputado Barros Munhoz. Colocava uma pessoa, só para acompanhar os encaminhamentos e manteria a imprensa bem informada sobre os meandros. Ele que se virasse para explicar os não é possível”.  Se não fez quando tinha chance de reversão, imagina agora. Dar o braço a torcer, nem pensar. O bonde passou! 

Barros Munhoz só reconquistou a maioria dos votos da cidade porque teve humildade para reconhecer a derrota e competência para dar a volta por cima, apesar de ter comido o pão que o diabo amassou por longos seis anos.

 

10- O que o município poderia ganhar com isso, olhando pelo viés político/econômico/social?

Muita coisa. O sistema político brasileiro ainda beneficia o “quem pode mais chora menos” e o “quem não chora não mama”. Apesar de  tais critérios serem lamentáveis sob o ponto de vista da isonomia e igualdade entre os povos, ter um porta-voz, um porta-benefício para a cidade, dentro de um sistema que privilegia poucos, considerando que levaremos anos para ter outro político como ele atingindo posições parecidas, perder essa oportunidade, por qualquer que seja a plausibilidade da justificativa, é um ato de desrespeito à população e de irresponsabilidade para com o futuro do município e dos nossos descendentes. Inclassificável se motivada por questiúnculas pessoais.  Será que a reprovação  ao grupo situacionista não está justamente nessa falta de desprendimento?

 

10- Você votou em Barros Munhoz?

Não. Votei no Gerson Bittencourt, do PT. Mas ele não recebeu a minha torcida contrária e nem o meu trabalho de mudar os votos de ninguém. Sou grato pela mão que ele estendeu ao Circolo Italiano quando foi solicitado. Mas isso não influenciou a minha decisão. Ele nada me pediu. Nada condicionou.  Aprendi que em democracia o respeito à decisão das pessoas ultrapassa muitas vezes o campo das ideologias. Ao tentar influenciar o mundo com novas idéias e corrigir eventuais distorções devemos fazê-lo no dia a dia, sem destruir o que o outro construiu.  Eu sempre me rendi à decisão da maioria, mesmo não concordando com ela.

 

11 – Deixe suas impressões acerca do nosso processo eleitoral.

Considero o processo eleitoral brasileiro eivado de falhas que comprometem o sistema representativo. O poder econômico, o uso da máquina e o excesso de  recursos de marketing mascaram os candidatos e inibem o aparecimento e a eleição de bons governantes e bons legisladores.  Nem por isso devemos defenestrar o processo eleitoral. Por pior que ele seja, “é melhor tê-lo do que não tê-lo”, deixando que a população corrija os eventuais desacertos. Sempre que posso, digo e repito: “eu prefiro os erros da democracia aos “acertos” da ditadura”.

Fonte: Nino Marcatti

Comentários, artigos e outras opiniões de colaboradores e articulistas não refletem necessariamente o pensamento do site, sendo de única e total responsabilidade de seus autores.

Outros artigos de Nino Marcatti
Deixe seu Comentário
(não ficará visível no site)
* Máx 250 caracteres

* Todos os campos são de preenchimento obrigatório

1108 visitantes online
O Canal de Vídeo do Portal Cidade de Itapira

Classificados
2005-2024 | Portal Cidade de Itapira
® Todos os direitos reservados
É proibida a reprodução total ou parcial do conteúdo deste portal sem prévia autorização.
Desenvolvido e mantido por: Softvideo produções