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Notícia
01/03/2021 | Luiz Santos: As dores do mundo

Entramos na terceira semana em preparação para a Páscoa da Ressurreição de Jesus Cristo. A silhueta da cruz já desponta no horizonte e para ela convergem as dores do mundo. Há exatamente um ano estamos vivendo um calvário planetário com essa pandemia de infinitas dores e nesses últimos meses, especialmente no Brasil, tem sido difícil de suportar. A pandemia deu-nos a ocasião de aprendermos muitas coisas, inclusive sobre nós mesmos. Durante um certo tempo esteve na moda falar sobre o novo normal, um novo mundo com um novo jeito de ser e de se relacionar durante e no pós-pandemia. Entretanto, confesso que jamais imaginei que esse novo normal implicaria no fato que muitas pessoas se acostumariam com o indecente e imoral número de mortos, na casa dos mil, a cada dia. Nunca imaginei que isso seria normal assistir ao colapso do sistema de saúde e ver em tempo real homens e mulheres morrerem indignamente sem terem ao menos a chance, o direito de lutarem por suas vidas, por falta de leitos hospitalares, oxigênio e insumos. Confesso que nunca passou pela minha mente que seria normal testemunhar indiferente o insano esforço de coveiros e retroescavadeiras abrindo covas coletivas para o sepultamento ‘descaridoso’ de entes queridos, quase sem dignidade humana. O novo normal parece ser um tempo de anestesia cultural que faz de nós mórbidos expectadores de um show de falta de empatia, negacionismo, indiferentismo e, no fim das contas, de puro egoísmo. Os célebres pregadores do passado como, André de Creta, Fulgêncio de Ruspe, João Crisóstomo, Agostinho de Hipona, Bernardo de Claraval, Francisco de Assis, Lutero, William Perkins, Thomas Boston, John Owen, Pe. Antônio Vieira, Jonathan Edward, Charles H. Spurgeon, Billy Graham, para citar apenas alguns, quando pregavam sobre os eventos pascais de Cristo, pintavam com cores fortes, vívidas, chocantes e até desconcertantes, a paixão, as dores, a maceração de Cristo no calvário. Ao ouvir esses pregadores, as assembleias originais vinham às lágrimas, tinham os seus corações compungidos, como que traspassados, feridos, havia um solene quebrantamento e muitas conversões radicais eram testemunhadas. Além do mais, sobre esses homens e mulheres que sofreram a ação do Espírito Santo à luz dessas maravilhosas pregações, um espírito de sensibilidade social, empatia para com os sofredores, de amor altruísta e abnegado, um senso urgente de missão e de desconforto com a situação geral da igreja e do mundo se abatia sobre eles. Suas vidas eram impactadas quando consideravam as dores de Cristo sobre a cruz e entendiam que em certa medida, a cruz sintetiza a paixão do mundo e só o ficar indiferente a ela, já seria pecado. Hoje podemos ler esses mesmos sermões, talvez eles sejam preciosos auxílios para despertarem em nós uma mais agudizada sensibilidade para com a realidade do sofrimento impingido pelo pecado, aumentar em nós um amor devotado a Cristo e uma melhor compreensão de como devemos responder à desconcertante lógica da cruz, que é o amor. Todavia, há uma outra maneira de nos deixar tocar pela paixão de Cristo que sofre em cada homem e mulher que neste mundo sofre os efeitos deletérios da injustiça, do descaso, da alienação e, por fim, o barateamento da vida e da dignidade. Se aceitarmos o conselho do brilhante teólogo Karl Barth, ter em uma das mãos a Bíblia e na outra o jornal, seremos certamente desafiados a sair de nossa zona de conforto autocentrada, egoísta e alienada. Usar o mote de que a vida tem que continuar pura e simplesmente porque eu não suporto mais viver sem sair com os amigos, frequentar rodas de confraternização, porque não vivo sem aquele período de descanso e férias. Insistir numa normalidade de bolha como a do futebol, como se nada estivesse acontecendo ou reivindicar a abertura de espetáculos e shows com aglomeração, porque a falta disso está levando as pessoas a desenvolverem enfermidades psicológicas tão graves quanto a pandemia, revela muito da nossa capacidade ou entendimento do que é viver uma vida cruciforme. Ao olharmos para a cruz que desponta no horizonte das celebrações litúrgicas, o Evangelho nos recorda que a vida cristã é feita de sacrifícios pessoais em benefício dos outros. As lições do calvário nos ensinam que assim como Jesus, somos chamados a viver a nossa vida ‘outrocentrada’, devemos ser sensíveis, empáticos, comprometidos com a dor alheia e mais, somos convocados a empenhar a totalidade da nossa existência para com Cristo, redimir o enredo dessa história de absurdidade e morte de uma sociedade com a consciência em rápido processo de cauterização.

Reverendo Luiz Fernando é pastor na Igreja Presbiteriana Central de Itapira

Fonte: Luiz Santos

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