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Itapira, 23 de Abril de 2024
Artigo
24/05/2012 | Luiz Santos: O desafio de Narciso

 “Sabe, porém isto: nos últimos dias, sobrevirão tempos difíceis, pois os homens serão egoístas, avarentos, jactanciosos, arrogantes...” (2Tm 3. 1-2).


O cristianismo enfrenta hoje o extremo desafio de uma cosmovisão narcisista, de uma mentalidade e uma cultura radicadas no “eu”, com uma percepção distorcida da realidade. Esta expressão “narcisismo” tem origem no mito grego de Narciso, um jovem belo e atraente, porém arrogante e orgulhoso. Amaldiçoado por uma deusa morre apaixonado por seu reflexo na água sem jamais conseguir ser correspondido pelo objeto de sua devoção.

O médico e psicanalista Sigmund Freud usou o termo “narcisismo” para identificar e descrever a primeira fase da infância quando a criança não é capaz de distinguir sujeito e objeto, quando tudo é para ela uma extensão de si mesma. Mais tarde, Freud encontrou traços similares em pacientes adultos. Estes pacientes demonstravam excessiva preocupação com o ego a ponto de distorcerem a realidade das coisas e dos fatos. Por não conseguirem conceber a existência do outro adequadamente, os narcisistas tendem a usar a realidade como um espelho para afagar o próprio ego. O outro está ali apenas para ficar impressionado, apenas como alguém disponível a ele. Na verdade o narcisista despreza o outro enquanto é dependente emocional dele, o que torna a sua vida superficial, vazia e cheia de temores. O narcisista não quer relações, quer somente recompensas emocionais.

Infelizmente este sistema de valores e de vida narcisista alcançou também os cristãos. Alguns sintomas podem ser fortemente sentidos:

1. Um forte sentimento de autossuficiência. “Ninguém tem nada a ver com a minha vida, eu sei o que é certo e errado.” “No meu nariz mando eu.” “Não preciso de ninguém para ser feliz enquanto eu tiver a mim”...

2. Um sentimento de desprezo e indiferença pelo outro. “Você pra mim é problema seu.” “Prezo a minha singularidade e a minha privacidade tanto quanto não me interesso pela vida e problemas dos outros.” Neste contexto não há amizades e nem fraternidade, apenas relações de interesse mútuo, sem maiores compromissos.

3. Consumismo exacerbado. Ser é possuir. O marketing explora a carência do narcisista levando-o a se sentir ainda mais insatisfeito com a vida do que já é se não possuir aquela marca, grife ou produto. O consumismo desenfreado dá vida ao descarte irresponsável e ao endividamento desnecessário.

4. Hedonismo: a busca pelo prazer instantâneo aqui e agora. Uma vida organizada tendo o prazer e a satisfação como o centro motivador. O trabalho, as artes, a vida social etc. devem encontrar seu pleno significado no prazer sem compromisso e sem consequências.

Mas então, qual é a cura para o narcisismo na Igreja e na Cultura:

1. A descoberta da realidade de Deus. Deus não é a solidão radical do absolutamente só. Deus é Trino, é um Deus-Comunidade, um Deus de relações como Pai, Filho e Espírito Santo. É um Deus que gera comunhão feliz e eterna com base no amor recíproco, na alteridade, na vida para o outro. É um Deus que tendo vida em si mesmo jamais quis viver ensimesmado em sua glória. Das misteriosas e amorosas relações na Trindade Bendita, surgiu o plano maravilhoso da criação do universo e do homem. Deus chamou todas as coisas à existência para compartilhar com elas sua vida e sua felicidade. A Santíssima Trindade nos ensina a viver em comunidade!

2. A redescoberta da realidade do Filho de Deus, que ao contrário de Narciso, não se apegou à perfeição de sua beleza eterna, antes, assumiu a forma de escravo, não quis ser servido, mas veio para servir. Não quis recompensas emocionais, mas amou incondicionalmente os seus, amou-os até à cruz. Do Filho amado aprendemos que temos vida na medida em que a gastamos para os outros. Que somos interessantes na medida em que nos interessamos graciosamente pelo próximo.

3.  Redescobrir a realidade do Espírito Santo que é doador da vida e de todos os dons e não um acumulador, um consumista desenfreado. A maravilhosa realidade do Espírito Santo nos impele à generosidade, à solidariedade e à partilha e nos ensina a possuir para distribuir e nunca para reter.  Também a dar com largueza sem jamais desperdiçar.

4. Redescobrir a maravilhosa realidade da Cruz. Do sacrifício do calvário aprendemos a organizar a nossa vida não na busca do prazer pelo prazer, mas encontrar deleite somente no compromisso com a verdade, a justiça e a vontade de Deus. Da realidade da cruz descobrimos nosso verdadeiro valor e nossa mais sublime vocação.

Reverendo Luiz Fernando

Pastor Mestre da Igreja Presbiteriana Central de Itapira

Fonte: Luiz Santos

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