Vários grupos espalhados pelos recantos da sociedade têm desenvolvido projetos com objetivo de proporcionar melhorias. As ações específicas reúnem um número considerável de pessoas e promovem reformas peculiares e bem localizadas.
Podemos citar aqui os trabalhos da Pastoral da Criança, ações entre amigos para ajudar certos desfavorecidos, atividades coletivas de cuidado com a natureza (limpeza de encostas de rios, limpeza de praias etc) e também cuidados com o bairro (limpeza de calçadas, certos embelezamentos. São ações importantes até certo ponto (bastante restrito), mas podem colaborar, paradoxalmente, para favorecer aquilo que pretensamente estariam combatendo.
Geralmente, o pressuposto de tais ações se inscreve na seguinte noção: já que o poder público é ineficiente e moroso, organismos da sociedade civil (portanto, instituições privadas) substituem as funções do Estado com vantagens. Neste sentido, corre-se o risco de incentivar outro pressuposto: mudar o mundo sem tomar o poder.
Trata-se de perspectivas temerárias para a organização social revolucionária, pois desconsidera uma visão de conjunto no tocante à forma de atuação do Estado e quanto às determinações sociais dos problemas da sociedade.
Não estamos jogando na vala comum tais ações. Queremos matizar seus pressupostos e seus efeitos para a articulação das transformações sociais mais efetivas.
A despeito da contribuição (no fundo a questão é delicada: qual contribuição, a favor de quais interesses, quais os efeitos estruturais dessa contribuição?) que os agentes da Pastoral da Criança ensejam para a saúde pública, deve-se perceber que tal atividade desobriga o Estado de um serviço público essencial, transferindo para uma entidade privada, que subsiste com trabalho voluntário de seus integrantes, sendo financiada basicamente com verbas públicas, reduzindo (apenas na aparência) o próprio custo das operações realizadas, exatamente pelo valor do trabalho delas. Logo, um argumento interessante para a privataria (concessões, fundações assumindo hospitais etc) que viceja como paradigma de solução para os deficientes serviços públicos. (continua)
Flavio Eduardo Mazetto (cientista político e professor) [email protected]
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