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Itapira, 29 de Mar�o de 2024
Artigo
04/06/2011 | “Nós pega o peixe”
Bastou parte da imprensa retirar frases coloquiais do livro "Por uma Vida Melhor", produzido pela ONG Ação Educativa e adotado pelo MEC, sem análise educacional especializada, nem leitura atenta e total, para que um monte de gente entrasse na luta, sem saber em que guerra estava. Será que a celeuma suscitada reproduz uma preocupação real com a língua mãe e com o grupo social atendido ou representa, apenas, o pensamento político partidário ideologizado sem causa? O livro em questão é direcionado à Educação de Jovens e Adultos. Eu poderia começar afirmando que a investida desses meios de comunicações foi prepotente e que seus mentores imaginam que a informação e o conhecimento são instrumentos de poder. Que acreditam que o entendimento de um texto independe do grau de capacitação do sujeito que o lê. Eu poderia atestar que não é de hoje - lá se vão quase vinte anos - que os livros didáticos de língua portuguesa, aprovados pelo MEC, trabalham com a variação linguística e com o tratamento que elas produzem em sala de aula, em função da condição social, regional e cultural dos aprendizes. Portanto, os “erros” apontados poderão ser encontrados em outros livros, doutras épocas, que nunca foram questionados pela “grande imprensa”. Eu poderia complementar, todavia, que a língua que se fala ou que se escreve de nada serve se não contribuir para o processo de comunicação entre os seres humanos, que habitam uma região delimitada, que agregam cultura e linguagem desenvolvida por vidas e histórias. Mas não trilharei por essas teses. Prefiro mirar na dificuldade de certas pessoas em ver o mundo sob uma perspectiva contínua, sem variações dinâmicas, debruçadas sobre modelos padronizados, lastreadas nas figuras que representam o certo e errado, definidos por minorias, que se achas com poder de disseminar conceitos para o resto da humanidade. E ai de quem não aceitar! Darwin, na sua obra “A Origem das Espécies” ou em qualquer artigo por ele publicado, não escreveu que “o homem vinha do macaco”. Mesmo assim, muita gente acredita que foi exatamente isso que ele prescreveu. O que ele sugeriu - isso mesmo, ele sugeriu - é que o homem e o macaco, em razão de suas semelhanças biológicas, teriam um mesmo ascendente em comum. Darwin, nesses estudos, contrariou preceitos seculares, feriu as pessoas que se julgavam acima de tudo e de todos. Como alguém importante e inteligente poderia ser originado do macaco? Foi a senha para que os fundamentalistas religiosos dessem uma versão estereotipada que agradasse aos ouvidos inconformados, os semelhantes a Deus. Tal relação, não é descabida, nem descontextualizada. Nunca li, de nenhum especialista, que o contato, não sequencial, com textos desprovidos da padronização culta da língua, desencaminhasse um aprendizado ou produzisse um novo código de comunicação. Se assim fosse, o que dizer da linguagem utilizada nos msn’s da vida pela maioria dos usuários. Será que os nossos adolescentes, um dia, escreverão ou se comunicarão à base de abreviaturas? O que serão dos trejeitos linguísticos nordestinos, no futuro, depois de utilizarem anos a fio, os mesmos livros didáticos adotados no sul do país? Nada. Sempre prevalece o conjunto da obra. Essa polêmica me transportou para um curso de desenho que participei - uns quinze anos passados - em que a professora nos deu uma figura e pediu que a desenhássemos observando a imagem de ponta-cabeça. E não é que o resultado, de todos, foi infinitamente melhor. Ela explicou: a inversão da figura enganou o lado crítico do cérebro, deixando o lado criativo, sem censura. Quer dizer, ao deixar a massa cinzenta trabalhar com liberdade, apenas com os conhecimentos adquiridos armazenados, ganhamos eficácia ao menosprezarmos as imposições enlatadas, por quem quer que seja. Eu conheço pessoas que jamais dizem: “nós pega o peixe” ou “os livro ilustrado mais interessante estão emprestado". Nem por isso, essas pessoas conseguem entender tudo o que lêem, por mais de cinco minutos. Ou sabem reunir argumentos. Ou conseguem manter um diálogo sério e aprofundado, em qualquer processo sofisticado de comunicação. Por outro lado, eu conheço gente, que apesar do domínio claudicante na gramática, se relaciona com desenvoltura em qualquer ambiente, como por exemplo, aquele que chegou à Presidência da República, saiu muito bem avaliado e ganha quinhentos mil dólares por uma palestra no exterior. Os despeitados costumam dizer que não vale a pena frequentar escolas e falar o português corretamente. Usa-se Lula como contra-exemplo. De fato, a recomendação é boa, mas é necessário ter mesma inteligência, poder de comunicação e articulação, dele. Nem todas as grandes personalidades mundiais foram construídas nos bancos escolares conhecidos. Recomendo, no entanto, que ninguém se arrisque em aventuras. O importante não é só entender o que lê, mas, principalmente, não alicerçar-se em conhecimentos não ou mal lidos, no que foi dito. Corre o risco de continuar achando que viemos dos macacos. Assim, “nós só pega o macaco” e olha lá!
Fonte: Nino Marcatti

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