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Itapira, 26 de Abril de 2024
Artigo
06/10/2013 | Nino Marcati: A praça de um povo sem praça, sem graça

Vivíamos na monarquia. A polícia imperial invadiu de forma violenta uma praça e expulsou a multidão que participava de um ato pró-república. Castro Alves, então, se apresentou no palanque e de improviso declamou: “A praça! A praça é do povo. Como o céu é do condor. É o antro onde a liberdade cria águias em seu calor. Senhor!... pois quereis a praça? (...)” Para o poeta, toda praça tem dono (o povo) e destinação (a liberdade).

 
Os espaços públicos, tais como praças, jardins e parques, no mundo inteiro são sagrados, cuidadosamente mantidos pelos poderes constituídos, mas, sobretudo, usados e preservados pela população. Não por acaso, as praças são consideradas essenciais no desenvolvimento de uma sociedade, tornam-se foco da vida social e cívica, refletem o êxito organizacional das concentrações urbanas e estabelecem o grau de cidadania dos possíveis usuários. Neles o individualismo pouco se manifesta e o espírito coletivo fala mais alto.
 
É dever dos governantes a harmonização estética, ambiental e social desses espaços, prevendo conforto, acessibilidade e, se possível, atividades diversas, autônomas ou monitoradas.
 
Na história da humanidade nenhum povo abriu mão dos seus espaços públicos, mesmo sendo para os mercados de trocas, execução de condenados ou anúncios reais. As primeiras praças, intencionalmente projetadas e noticiadas como tal, vêm dos gregos, a ágora, e dos romanos, o fórum. Nelas praticava-se a democracia direta, as discussões e as trocas de ideias entre os cidadãos. Da ágora se via a acrópole, a morada dos deuses gregos, e o fórum romano que era a própria representação do Estado.
 
Devemos às praças os grandes acontecimentos históricos, as comemorações cívicas, eleitorais, esportivas, religiosas, recreativas... No mundo inteiro, com a revolução dos costumes e a proliferação dos veículos motorizados, as praças sofreram transformações, mas mantiveram o processo de ocupação cotidiana. No Brasil, as praças, salvo raríssimas exceções, foram abandonadas, total ou parcialmente, tanto pelo poder público – e o que é pior - como pela população. A tese não está catalogada, mas desconfio que o processo de deterioração se deu mais ou menos assim: primeiro os prefeitos abandonaram as praças às próprias sortes, perderam o bonde das mudanças culturais e sociais e se acomodaram diante da retração popular, permitindo que esses espaços passassem a ser ocupados por pequenos traficantes, usuários de drogas, prostitutas, travestis, flanelinhas e desocupados em geral. Construiu-se, então, o espaço público da insegurança. O avesso do avesso.
 
Desconfio que daqui a pouco, as cidades nada mais terão o que fazer com seus espaços públicos abandonados, que para uma manutenção razoavelmente civilizada se tornarão sorvedouros de dinheiro público sem causa. Talvez venhamos a discutir, logo, logo, a construção de estacionamentos para dar conta do excesso de automóveis e motos circulantes nos centros comerciais ou de grandes edifícios para shopping ou residências. Enfim, em algo que possa ser utilizado pelas pessoas que optaram pelas trincheiras cercadas por quatro paredes. Espero não estar mais neste mundo caso isso venha mesmo acontecer.
 
Não faltam defensores dos espaços públicos. Faltam usuários. Além da participação do poder público nas revitalizações chamativas e acolhedoras, precisamos que as pessoas de bem voltem a ocupá-los de forma consistente. Voltem a defendê-los como propriedades coletivas. Voltem, principalmente, sentir prazer nessa ocupação. Afinal, a praça é do povo! E quem somos nós?
Fonte: Nino Marcati

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