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Itapira, 29 de Mar�o de 2024
Artigo
18/02/2012 | O homem que lia jornal no salão de carnaval

 

 

Não é a toa que a maioria dos cinqüentões – e daí pra frente - se derrete pelo carnaval de tempos atrás. Os mais jovens que me perdoem, mas apesar dos avanços nos costumes, da liberdade sexual etc. aqueles quatro - ou cinco - dias eram de arrepiar. Em alguns aspectos pode-se dizer que daquilo que os jovens de hoje tem distribuído nos trezentos e sessenta e cinco dias do ano, nós – por exagero intencional deste que voz escreve - tínhamos naquele curto período de carnaval. Um período em que quase tudo podia. Era o tempo da folga do namoro, da olhadela sem grandes recriminações, das trocas com recomposição posterior, de se vestir ao contrário homem ou mulher, de ficar com menos roupa na praça principal da cidade, do descompromisso, da quebra de rotina, de mostrar novas facetas, da sequencia de consumo de bebidas alcoólicas, da alegria contagiante... Participativa! 

A cidade vivia o clima de carnaval logo no início de janeiro quando a Rádio Clube de Itapira dedicava parte significativa da sua programação na difusão das marchinhas e dos sambas do carnaval daquele ano e rememorava as famosas dos anteriores. A audiência ficava lá em cima, todo mundo queria aprender as novas letras para cantar, enquanto “pulavam” nos salões. Era o nosso “esquenta”. Os grupos se reuniam para organizar os blocos e as fantasias. Os mais criativos guardavam a sete chaves os segredos das suas apresentações. Itapira tinha quatro clubes que ofereciam bailes concorridíssimos. Na área central, na praça, o Centro Comércio e Indústria atendia, basicamente, a classe média.

Enquanto o Clube XV, os mais abastados. Perto dali, o Salão do Dito Negrinho reunia negros, mulatos e simpatizantes. Mais afastado, na Rua Alfredo Pujol, a Sociedade Operária completava o arco social. Tínhamos, ainda, os bailes dos bairros rurais. Muitos foliões tinham o costume de fazer a “via sacra”. Davam uma “passadinha” em todos os bailes possíveis. Poucas pessoas se refugiavam em chácaras de recreio ou viajavam para outras cidades. O carnaval de Itapira era sensacional. Atraia foliões vizinhos e paulistanos. Parentes ou conhecidos que não perdiam o Reinado de Momo tupiniquim, de jeito nenhum.
 
Ao primeiro acorde da orquestra lá estavam os tradicionais foliões abrindo o salão, chamando todo mundo para “pular” o carnaval. Gente que varava a noite, na maior agitação, só dava paradinhas para as necessidades básicas. O ambiente, em qualquer clube, era de harmonia e diversão. Brigas só por conta dos ciumentos que insistiam em manter a relação, naqueles dias, ou nas eventuais disputas masculinas por uma determinada “prenda”. As músicas eram apresentadas misturando novas composições e os sucessos de sempre. Todo mundo cantava. Quem ficava nas mesas espiando, lá pelas tantas, cantava e rebolava sem sair do lugar.
 
Como em qualquer manifestação cultural, algumas pessoas se sobressaiam pela fantasia, pela personagem, pela alegria diferenciada e exclusiva do carnaval, pelas invenções... 
 
Nomes importantes do carnaval estão nas cabeças dos itapirenses que já viviam naqueles tempos. Casais que se fantasiavam e levavam para os salões a unidade familiar. Blocos que extrapolavam a fantasia organizando coreografias ou passavam mensagens de protestos ou críticas num tempo onde a liberdade de expressão era controlada. Criações individuais chamavam a atenção da cidade inteira e virava comentários por todos os cantos. Assim, como havia uma espécie de alforria para os deslizes alcoólicos ou comportamentais.          
 
Mas no meio de tanta maluquice, barulho e agitação tinha um homem, absolutamente normal, porém bem humorado, que ia para o salão, abria um jornal e circulava como se estivesse compenetrado na leitura, parecia nos dizer que carnaval era divertido, mas também era cultura. Pena que pouca gente deve tê-lo visto dessa maneira.
 
Fonte: Nino Marcatti

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