O presente livro, publicado em 2014 com 604 páginas pela Editora Ecclesiae, de Campinas, reúne 133 longas catequeses e mais seis audiências públicas do Papa São João Paulo II, proferidas de 1979 a 1984, “apresentando e presenteando a todos nós com um verdadeiro tratado de antropologia e teologia moral-sexual, que com o passar do tempo adquiriu o nome de catequeses da teologia do corpo” (p. 13).
No terceiro ciclo das exposições, o Santo Padre entrou também, com precisão, no campo da Escatologia (p. 287-326) ao tratar da ressurreição da carne a partir de passagens bíblicas extraídas especialmente dos Evangelhos e das Cartas de São Paulo interpretadas, inicialmente, pelos Padres da Igreja, conferindo, assim, rico valor às alocuções.
Convém, no entanto, aqui lembrar o significado preciso de Escatologia e Padres da Igreja, uma vez que tocamos neles. Pois bem, Escatologia vem de eschaton, que, em grego, significa “últimas coisas” e tem seu sinônimo em novíssima (plural neutro de novissimum,i, em Latim), que deu novíssimos em Português, e quer também dizer “últimos acontecimentos”. Trata da morte, juízo, inferno, paraíso e temas correlatos como o purgatório, ressurreição da carne, juízo final etc.
Já por Padres da Igreja entendemos aqueles homens – sacerdotes, religiosos ou leigos – que nos oito primeiros séculos do Cristianismo muito contribuíram para a reta formulação das verdades de fé. Daí “Padres” ter, aqui, não o sentido de sacerdotes, mas de pais da Igreja. O ciclo clássico desses Padres termina com São Gregório Magno (séc. VII) no Ocidente e com São João Damasceno (séc. VIII) no Oriente, embora se possa atribuir esse título a grandes vultos da Teologia ao longo do tempo, como se atribui, por exemplo, a São Bernardo de Claraval, que viveu no século XII.
Voltando-nos para a obra em si percebemos, na nota 4 da página 293, um dado interessante que responde a correntes escatológicas mais recentes de fundo monista, ou seja, que creem, de modo desligado do Magistério da Igreja, que o homem morre todo (corpo e alma) e, logo após a morte, já ressuscita todo. Ora, contra esse monismo se opõe não o dualismo (oposição entre alma e corpo, comum especialmente na filosofia grega), mas, sim, a dualidade. Esta salvaguarda a distinção entre o corpo material e a alma espiritual, mas afirma que há entre um e outro um complemento mútuo.
Sim, a Igreja diz que na morte há a separação do corpo e da alma; esta volta para Deus a fim de ser julgada e aquele é devolvido à natureza material de onde veio. No Juízo final, por graça de Deus, esse corpo se reunirá novamente à alma, não, porém com a natureza material que antes tinha, mas, sim, como corpo espiritualizado ou glorioso, sem perder, porém, a sua identidade de João, Antônio, Madalena, Lucas etc. (Cf. Congregação para a Doutrina da Fé, Recentioris Epyscoporum Synodi, de 17/05/1979).
Na página 553, lemos – contra os que, erroneamente, acusam a ética cristã dos últimos anos de ser muito etérea e se esquecer das realidades concretas do ser humano – o seguinte: “Quem julga que o Concílio [Vaticano II – nota de Refletindo] e a Encíclica [Humanae Vitae – nota de Refletindo] não têm suficientemente em conta as dificuldades presentes na vida concreta não compreende a preocupação pastoral que deu origem àqueles documentos. Preocupação pastoral significa busca do verdadeiro bem do homem, promoção dos valores gravados por Deus na sua pessoa; isto é, significa atuação daquela ‘regra de compreensão’, que aspira à descoberta cada vez mais clara do desígnio de Deus sobre o amor humano, na certeza de que o único e verdadeiro bem da pessoa humana consiste na atuação deste desígnio divino”.
Em outras breves palavras: a moral católica não é apenas um freio imposto ao ser humano, mas impossível de ser vivenciado; ao contrário, ela é direção ou seta segura que, levando em conta a fraqueza humana pecadora, aponta para o Bem único e necessário capaz de satisfazer, muito acima dos prazeres momentâneos, as inquietações humanas: Deus.
Não há outra razão para estarmos neste mundo, como peregrinos do Absoluto, senão a de conhecermos, amarmos e servirmos a Deus e mediante isso ganharmos a Pátria definitiva, a Jerusalém celeste, a felicidade total, enfim, o céu.
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Vanderlei de Lima é filósofo e escritor
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